Troca de ofensas, músicas com ataques direitos, posts em redes sociais e acusações criminosas. O confronto entre dois dos maiores rappers da geração marcaram a última semana. Entretanto, como começou? Por que ainda segue? Esses são questionamentos que persistem em muitas pessoas que não estão completamente a par da briga.
Por isso, nesta linha do tempo, a Equipe Flagra preparou uma matéria com uma linha do tempo explicativa sobre os acontecimentos de uma das maiores brigas do Hip Hop. Flagra!
1. Future part Kendrick “Like That” (Prod. Metro Boomin), 26 de Março
Motherfuck the big three, nigga, it’s just big me
— Kendrick Lamar, em “Like That”
Toda a tensão do momento se instalou após Kendrick menosprezar Drake e J. Cole, respondendo diretamente a uma linha do Cole em sua colaboração de 2023, na música “First Person Shooter”, do álbum de Drake, “For All The Dogs”.
Em seu verso, Cole comentou que adora quando as pessoas discutem quem é o melhor rapper, se é Kendrick, Drake ou ele, afirmando que na verdade eles são os “3 Maiorais”, como se estivessem no mesmo patamar. Então Kendrick usou seu verso em “Like That” para marcar território afirmando que somente ele é o melhor rapper da atualidade.
2. Drake “Push Ups”, 19 de Abril
Drop and give me fifty, drop and give e fifty, ayy
— Drake, em “Push Ups”
Como resposta ao verso do Kendrick em “Like That”, Drake lançou “Push Ups”, faixa na qual ataca não só o rapper de Compton, mas Future e Metro Boomin. A tese central da diss são as escolhas da carreira de Kendrick, sendo questionado pelas participações com artistas do pop e sua parcela na distribuição de suas músicas, em outras palavras, o controle criativo de sua arte, em que boa parte da sua carreira foi comandada por Top Dowg da gravadora TDE. O trecho mais marcante da faixa é quando o canadense faz um jogo de palavras com as flexões (“push ups” em inglês) e a parcela de distribuição das músicas (50%) para tirar uma onda com a credibilidade de ruas do estadunidense – a linha também se refere a um vídeo publicado pelo Kendrick fazendo flexões no estilo dos presidiários estadunidenses.
3. Drake “Taylor Made Freestyle”, 19 de Abril
How are you not in the booth? It feel like you kinda removed
— Drake, em “Taylor Made Freestyle”
Sem deixar que Kendrick pudesse digerir “Push Ups”, Drake lança a faixa mais polêmica da série, por conter um trecho inicial com áudio modificado por IA para parecer as vozes do Tupac e Snoop Doog. Nesta faixa o canadense volta a destacar a relação de Kendrick com a indústria, por isso o jogo de palavras com o nome da Taylor Swift e roupas feitas sob medida (“Taylor made” em inglês). Também é uma forma de o MC questionar a credibilidade do artista de L.A., que recebeu simbolicamente a tocha como o principal rapper desta geração das mãos do próprio Snoop Dogg e pela sua relação com Tupac – seu segundo disco ‘To Pimp A Butterfly’ tem muita influência do falecido artista, incluindo inclusive um entrevista simulada do Kendrick com Tupac, construída com um áudio antigo.
4. Kendrick Lamar “euphoria”, 30 de Abril
I’m what the culture feelin’
— Kendrick Lamar, em “euphoria”
Em “euphoria”, a primeira aparição de Kendrick desde seu verso em “Like That”, o rapper de Compton inicia uma série de ataques qualificados à reputação de Drake como artista e pessoa. O título da faixa alude à série da HBO de mesmo nome que retrata situações e relacionamentos vividos por um grupo de estudantes do ensino médio. A alusão é potente não somente porque Drake é o produtor executivo da série, mas também porque reanima os rumores de que o rapper canadense se relaciona ativamente com meninas bem mais jovens do que ele, motivo que foi explorado por Kendrick em mais detalhes nas disses seguintes.
Ao longo dos 6 minutos de faixa, Kendrick ataca a credibilidade de Drake como rapper, sugerindo que ele não é nativo da cultura hip hop e está desconectado da cultura negra em geral, questiona o papel que ele desempenha na formação de seu filho Adonis e convoca todos os ghostwriters de Drake para o combate. A faixa traz muitas linhas cortantes e memoráveis, mas é claramente um aviso para canadense saber com quem está lidando nessa treta.
5. Kendrick Lamar “6:16 in LA”, 3 de Maio
Have you ever thought that OVO is workin’ for me?
— Kendrick Lamar, em “6:16 in LA”
Sem dar descanso para o nosso rapper de Toronto, Kendrick lança a terceira faixa na sequência. Essa em particular tem um tom mais sério e reflexivo, como se estivesse aconselhando Drake. Dois detalhes importantes, o primeiro: tem produção de Jack Antonoff, conhecido por produzir as músicas da Taylor Swift, caçoando da tentativa de Drake em humilhar Kendrick por suas participações pontuais em faixas pop. O segundo: a música seria uma isca para Drake, afirmando que Kendrick teria pessoas infiltradas na OVO passando informações para ele.
6. Drake “Family Matters” (Prod. Boi-1da · Tay Keith · Mark Ronson; Fierce; Kevin Mitchell), 3 de Maio
Top would make you do features for change, get on pop records and rap for the whites
— Drake, em “Family Matters”
Aqui Drake fez o máximo de esforço que conseguiu. Ainda com linhas questionáveis aqui e acolá, essa foi o apogeu musical de Drake na briga. O canadense apelou para boatos de que Dave, o melhor amigo de Kendrick, seria pai de uma das crianças do rapper, assumiu que o mc de Compton teria vergonha de seus filhos por serem fruto do casamento com uma mulher negra de pele clara e afirmou (sem evidências até agora) que Kendrick já bateu nela. Entre o mau gosto e a pura maldade, Drake tentou recuperar a credibilidade e a negritude negada pelo rival. Como sabemos, talvez não tenha sido bem sucedido em nenhuma.
7. Kendrick Lamar “Meet The Grahams” (Prod. The Alchemist), 3 de Maio
Sandra, sit down, what I’m about to say is heavy, now listen
Mm-mm, your son’s a sick man with sick thoughts, I think niggas like him should die
— Kendrick Lamar, em “Meet The Grahams”
Um instrumental leve e sereno constrói a calmaria, notas dissonantes de piano impõe o terror lento, mas é nas linhas que Kendrick, usando as versões raivosas e rancorosas de suas vozes, apresenta um terror talvez nunca antes visto numa diss track.
A música, que muitos descrevem online como indigesta e de difícil repetição, constrói o perfil decadente de um Drake narcisista que, embebido num hiperego munido pelo acúmulo de capital financeiro e simbólico, abusa sexualmente de menores e mulheres num geral.
Kendrick se sustenta em informações pinceladas publicamente ao longo de mais de uma década de fofocas e registros do comportamento online do rapper Canadense, curtindo fotos de garotas de 16/17 anos de idade, trocando mensagens esquisitas com Millie Bobby Brown quando ela tinha apenas 14 anos de idade e beijando uma adolescente no palco.
Essa música ocupará nossos pesadelos e talvez venha a quebrar o pouco que restou da família do Drake, que ainda por cima, segundo K-Dot, está pra assumir mais uma criança por aí, neste caso uma menina de onze anos (agora a capa de Certified lover boy faz sentido).
8. Kendrick Lamar “Not Like Us” (Prod. DJ Mustard), 4 de Maio
Certified Lover Boy? Certified pedophiles
— Kendrick Lamar, em “Not Like Us”
Novamente, sem dar descanso para Drake pensar em um plano, Kendrick reforça suas afirmações da diss anterior em uma produção do DJ Mustard. A escolha não é à toa, a faixa se parece com um hit dançante típico da West Coast nos anos 90, uma batida que daria orgulho a Tupac – não ironicamente, a produção tem um ritmo que lembra a diss “Hit’em Up”. Demonstrando toda sua versatilidade e criatividade, o MC de Compton explora os flows, cria trechos memoráveis e estabelece uma narrativa forte pautada na ideia de que Drake não é como aqueles que fazem parte da cultura. Sendo bem sincero, neste ponto da briga não há como deixar de apontar que Drake teve seu legado descredibilizado.
9. Drake “The Heart Part. 6” (prod. Boi-1da), 5 de Maio
This Epstein angle was the shit I expected
— Drake, em “The Heart Part. 6”
Com rumores de que Kendrick teria mais uma faixa pronta para ser lançada na segunda, 06/05, Drake fez um de seus movimentos mais inteligentes nesta treta, roubou para si uma das partes da famosa série “The Heart” do Kendrick. Nesta série, Kendrick geralmente faz um resumão reflexivo sobre o contexto em que desenvolveu seu último disco antes de seu lançamento. A série que iria para o sexto capítulo, seguindo a ideia de Drake ser o Deus do 6 (“6 God”), agora teve a sequência interrompida pelo canadense. Infelizmente, a jogada de mestre parou por aí.
Embora a produção seja uma das mais consistentes entre as “disses” já lançadas pelo canadense, a faixa traz um tom defensivo e uma escrita questionável, desta vez não por conta de possíveis ghostwriters, mas por trazer respostas às acusações de Kendrick que ao invés de justificar ou enfraquecer a narrativa construída pelo estadunidense, o comprometem ainda mais. Por exemplo, porque se comparar Jeffrey Epstein, acusado por tráfico de menores, ou citar Millie Bobby Brown, atriz com quem nutre uma suposta amizade desde que ela tinha 13 anos, a qual nem havia sido citada na treta? É quase como se Drake vestisse a carapuça das acusações de pedofilia do artista de Compton. Além disso, o rapper encerra a faixa quase que se entregando, com sentimento de desmotivação. O que era uma insistência pela treta com “Push Ups” e “Taylor Made Freestyle”, agora aparece como um arrependimento por mexer com alguém fora de sua liga.