O ano de 2018 foi um ano que nos trouxe inúmeros discos de qualidade no rap; discos estes que são facilmente lembrados pelos aficionados pelo gênero. Para citar alguns que tivemos:
- ‘O menino que queria ser Deus’ do Djonga, um disco aclamado pelas críticas e fãs;
- ‘Bluesman’ do Baco, que foi apresentado um público maior e para o circuito comercial sem deixar de lado a temática racial;
- ‘Gigantes’ do Bk, álbum premiadíssimo;
- ‘Amar é Para os Fortes’ do Marcelo D2, que apresentou uma uma versão mais mais madura de si, explorando a temática do amor por novas perspectivas;
- ‘Espelho’ da Drik Barbosa, uma verdadeira apresentação da artista que apesar de estar na cena a algum tempo, ainda não havia lançado um projeto completo;
- ‘Ambulante’ da Karol Conká, a esperada sequência do seu sucesso Batuk Freak;
- ‘SCA’ do FBC, disco que mostrou a criatividade do artista em explorar temas diferentes, mesmo em cima de traps.
É nessa época que o trap começa a se tornar o fenômeno nacional. Para dar um exemplo, Plaqtudum, da Recayd, se tornou um megahit e muitos artistas desta vertente começaram a lançar projetos mais concisos, como é o caso do Ma Ninja.
MC Igu sempre trouxe em seus projetos sonoridades diferentes, levadas e entregas criativas e composições bem humoradas. Mas é em Subliminar que tudo isso se alinha da melhor forma possível, elevando o disco ao mesmo patamar de outros lançados naquele ano. Talvez por fazer parte da cena de trap, muitos não tenham dado a devida atenção para o disco.
Um pouco desta obra incompreendida
Igu é um daqueles MCs que tem uma habilidade apurada na produção e isso fica muito evidente em Subliminar. Inteiramente produzido pelo próprio artista, fica nítido que ele se sente muito confortável nas suas próprias produções. Pra mim, esta característica é o que faz este disco ser tão criativo e gostoso de ouvir.
Apesar de a maioria de suas músicas serem trap, as influências de outras sonoridades, como funk, música japonesa e trilhas de videogame, trazem um sentimento de novidade, tornam cada faixa única entre si. Essas influências não fazem parte só da produção, mas também da composição das letras do MC. Tudo se encaixa de forma muito orgânica e harmoniosa. E talvez o que ligue tudo isso é a forma como ele aborda os assuntos, certas horas de maneira mais séria e em outras bem humorada.
Há também uma entrega muito criativa, uma marca do Igu. Seu flow e sua entrega são inesperados, com acelerações e desacelerações, e o uso do autotune é suave, isso cria uma atmosfera que junto com as produções se torna extremamente agradável. Por exemplo, em Sugee, em conjunto com a formação da época da Recayd, o rapper varia a cadência da entrega no seu verso, inclusive buscando se diferenciar dos companheiros no som, enquanto que em 8 Bit temos um MC muito mais livre para explorar o delivery em uma produção mais criativa influenciada pelas trilhas sonoras de jogos antigos, nela há mais espaço para as mudanças de velocidade no momento que apresenta suas rimas.
Na escrita, se destaca a construção dos refrãos, eles grudam com facilidade na sua mente, te deixam com vontade de repetir junto. Como acontece em “G-Quan III”, que casa perfeitamente com a sensação de braggadoccio da música ou repetitivo refrão de “Michael Mayers”.
Ou ainda em Buenos Aires, que sampleia tango. Mesmo as faixas mais explícitas possuem um charme, como é o caso do Motel, que fala de sexo, a letra bem humorada e a excelente entrega com autotune é simplesmente viciante:
Domínio perdido
Este disco retrata a criatividade do Igu, uma das características mais fundamentais do trap, mas que ao longo do tempo se perdeu na cena. Este mesmo Igu atualmente é uma fração do que apresentou em Subliminar. Seus projetos mais recentes mostram um MC pouco inspirado nas letras, nos flow e sem aquelas produções com a qualidade criativa e original que ele mostrava neste disco de 2018 ou em Flow Deus (2017).
Quando eu penso no termo subestimado, logo me vem à cabeça essa obra. Por ser um ano com destaques como os citados anteriormente, produzidos por artistas com expressão na cena, a obra do MC Igu acabou passando despercebido para muitos. Isto não necessariamente é um demérito para Subliminar, talvez até uma qualidade, pois coloca o disco entre aqueles que um ouvinte pode descobrir muito tempo depois e motivar a buscar mais referências do Igu ou do próprio trap.