Destaques 2K23: Decepções

Essa é a quarta parte da nossa lista, e após falarmos das melhores músicas, dos artistas novos e do que mais nos surpreendeu em 2023, chegou a hora de falarmos sobre as nossas decepções.

Antes de mergulharmos na categoria, queremos destacar a importância da crítica construtiva no desenvolvimento da arte.

Reconhecemos que o termo “decepção” pode gerar sentimentos complexos, mas nossa intenção é promover uma apreciação mais criteriosa, especialmente quando esses talentosos artistas já nos presentearam com trabalhos incríveis anteriormente e se encontram em uma fase muito bem desenvolvida da carreira.

Entendemos que todos estão em constante busca pela excelência, e a reflexão sobre desafios pode ser um catalisador para a evolução, pois para criar uma melodia harmoniosa e duradoura, é necessário ajustar o tom. Assim sendo, mais do que uma análise, essa abordagem representa um caminho para o aprimoramento mútuo, uma ferramenta que consolida padrões de qualidade e promove uma compreensão mais profunda da música.

Celebrar sucessos é vital, mas também reconhecer áreas de crescimento contribui para uma comunidade mais rica e reflexiva. Encorajamos todos a verem essa categoria como uma oportunidade de diálogo, enfatizando que o objetivo é elevar a música negra a patamares ainda mais extraordinários.

“Ascensão do Cisne Negro” de Major RD

ESCRITO POR

Michel Chermont

Para quem viu aquele MC rimando de forma descontraída com uma qualidade absurda no Brasil Grime Show, ou mesmo antes, com seu parceiro Xamã, talvez não reconheça o que foi feito em Ascensão do Cisne Negro.

Major RD é um dos artistas que mais acompanho desde 2019, desde que ouvi seu verso no disco do Xamã em “Taxi Drive”, mesmo já tendo escutado algumas faixas suas na Brutang44.

A partir disso e do lançamento de seu primeiro EP, testemunhamos a evolução do artista carioca. Um jovem promissor, com um “flow de Deus”, que nos presenteou com um álbum de estreia impressionante e participações destacadas em outros projetos em 2021. No entanto, ao contrário do primeiro álbum, seu segundo trabalho não conseguiu igualar a mesma qualidade.

Letras descontraídas e um flow bom foram elementos que levaram o rapper à sua ascensão, mas que tornam-se monótonos ao longo de cinco anos consecutivos.

Apesar de existir algumas faixas interessantes no meio do marasmo desse álbum, o que testemunhamos é o declínio de um cisne que, de fato, se assemelha àquele do conto: começou a ser visto como “bonito” após crescer na cena, mas não mantém metade da entrega e qualidade daquele que era considerado “feio”.

A “Ascensão” de Major não entrega nem um terço do que apresentou seu predecessor. O disco buscou aprimorar uma estética bem-sucedida nos “bate-cabeças” do álbum passado, um elemento essencial nos shows de RD atualmente, porém executado de uma forma bem mediana, bem longe da capacidade que sabemos que Rodrigo pode entregar.

O segundo álbum de Major apenas repete fórmulas já utilizadas em trabalhos anteriores. A autenticidade e a busca pela inovação constante do rapper carioca, sua marca registrada, foi deixada de lado em prol do conforto do que já deu certo. Infelizmente, são raras as vezes que um raio cai no mesmo lugar.

“Para Todos os Garotos que Já Mamei” de N.I.N.A

ESCRITO POR

Kleber Briz

NINA tem sido uma das minhas artistas favoritas nos últimos anos. Seu disco anterior, participações e tudo que ela esteve envolvida sempre me impressionaram de alguma forma, seja pela sua originalidade ou seu carisma natural. Contudo, este último disco, Para Todos os Garotos Que Já Mamei, é totalmente o oposto das características que me aproximaram da Nina.

Uma das decepções é a questão estética adotada pela carioca, inspirada na franquia ‘Para Todos os Garotos que Já Amei’ da Netflix. O trocadilho com o nome é pouco criativo, e o conceito de realizar essa aproximação ficou um pouco estranho. Inclusive, parece que isso afetou de certa forma a própria entrega da artista ao longo das músicas, que aqui surgem mais cantadas e lentas, bem diferente do que estamos acostumados a ouvir da Nina.

A MC sempre teve certa sagacidade em entregar flows e vocais com muita precisão, mesmo em ritmos mais acelerados. Em ‘PTOGQJM’, as produções parecem que não encaixam com as mensagens. Não é surpresa que a melhor faixa é justamente a mais acelerada, “Despedidas”, um belo drill romântico que mostra um pouco da levada única da artista.

O disco foi bem produzido e teve uma boa recepção nas redes sociais, mas está longe de ser um daqueles discos que se destaca na discografia de um artista, fazendo justiça a todo seu potencial. Nina ainda vai conquistar muita coisa, mas esse disco, infelizmente, ficou um pouco abaixo do que ela pode oferecer.

“Inocente Demotape” por Djonga

ESCRITO POR

Paulo Neto

Em Inocente Demotape de Djonga, o rapper se aventura numa tentativa de reinvenção musical e artística, um aspecto positivo que ele necessitava há algum tempo. No entanto, a promessa de novidade desvanece rapidamente.

Ao se afastar de sua colaboração habitual com Coyote Beatz, Djonga busca explorar sonoridades mais leves e festivas, confiando a produção à equipe da Supernova Entertainment, composta por Nagalli, Bvga, Honaiser, junto com a contribuição de outros produtores como Ajaxx, H4lfmeasures, Jhxw e Rapaz do Dread. No entanto, as esperanças de uma mudança significativa são frustradas, já que Djonga não atualiza sua abordagem lírica nem explora novas nuances rítmicas efetivas nas vertentes escolhidas.

O álbum repete fórmulas conhecidas de lovesongs e dilemas amorosos, já marcantes na carreira do artista, como, por exemplo, a temática de amar demais uma mulher, trair e assumir isso como se fosse algo legal de se fazer, num vício desenfreado em interpretar um cafajeste descolado e ingênuo, quando na verdade só parece o típico cara que as mulheres sentem desprezo. Isso é preocupante, considerando que ele afirmou que o disco é fruto de um “processo de vida extremamente pessoal”.

O desempenho na execução é fraco, entregando um jersey club e traps melódicos pouco convincentes. Nem mesmo os feats com Veigh, Cabelinho, Tz da Coronel e Thiago Lisboa sustentam as músicas, destacando-se apenas a participação maravilhosa de Iza Sabino e Laura Sette na faixa “Fumaça”.

Sabemos que Djonga é muito talentoso e criativo; a sensação que fica é que falta a ele recuperar a autocobrança para escrever letras verdadeiramente boas e trabalhar flows mais desenvolvidos, independente da temática, algo que ele já demonstrou em seu auge. A questão é se ele sente a necessidade disso, já que seu público fiel abraça qualquer lançamento, bom ou ruim. Por um lado, isso permite que ele mantenha sua estrutura e auxilie outros artistas de sua gravadora, A Quadrilha, e também continue gerando emprego para seus iguais, algo que ele tem orgulho de dizer que faz. Por outro lado, esse desleixo com seu desempenho técnico torna sua arte mediana. No fim das contas, o álbum deixa a sensação de que Djonga, uma vez inovador, agora luta para atingir suas próprias alturas passadas, estagnado em uma desconcertante regressão artística.

“Vida Cara” por Orochi

ESCRITO POR

Kleber Briz

Vida Cara do Orochi foi um sucesso nas plataformas de reprodução e junto com sua trajetória recente de hits, fez com que o artista carioca vendesse muitos shows. O artista carioca é responsável por nos entregar “Balão”, estar envolvido em inúmeros hits nos últimos anos e participar de projetos como Poetas no Topo, Poesia Acústica e Favela Vive, mostrando tanto a capacidade de rimar sobre amor quanto criar versos mais conscientes. Apesar disso, Vida Cara não é um disco marcante. São 26 faixas, mais de 1 hora e 30 minutos com um Orochi pouco inspirado. 

As temáticas são repetitivas, entregas, em especial do artista principal, quase  que idênticas de uma música para outra e uma sequência que te faz pensar se não seria melhor deixar pelo menos umas 10 faixas de fora. São as participações que chamam mais atenção, o que aumenta o sentimento de decepção. Ele pode mais e apesar do sucesso comercial do disco, o carioca precisa se reencontrar criativamente, mesmo se as temáticas forem mais simples, como as que tem explorado: bebidas, sexo e dinheiro.

Orochi deve ter se perdido no conceito, a ideia de uma Vida Cara é explorada superficialmente, com a ironia de se tornar de fato rasa. 

“Yin Yang” EP por Tasha, Tracie, Kyan & Rapper Gregory

ESCRITO POR

Kleber Briz

Este, com certeza, foi um disco que não esperávamos. Três artistas que possuem um potencial imenso, que fizeram muito sucesso nestes últimos anos – as gêmeas Tasha & Tracie, que tiveram o disco Diretoria muito aclamado pelos ouvintes e críticos, e Kyan, que em conjunto com Mu540 têm proporcionado para a cena um rap bastante influenciado pelo funk da baixada santista e pela música eletrônica. Juntos a esses artistas já conhecidos, temos o rapper Gregory, que fecha o conjunto que é constituído por dois casais.

Yin Yang apresenta um pouco do sentimento romântico desses casais misturados com a vivência das ruas, mais especificamente o romance no contexto dos bailes, o amor mandrake ou mandraka. O conceito é interessante, o nome do disco entrega essa ideia do lado bom e ruim desse amor. Porém, o que era um bom conceito não é necessariamente bem explorado pelos artistas.

As faixas em si parecem que não se conectam, problema que aparece entre versos de uma mesma música também. O disco está bem produzido, mas as produções também sofrem com certa confusão nas mudanças nas batidas, o que fortalece o problema da falta de conexão entre versos.

É uma pena que o EP deixe a desejar. Kyan, Tasha e Tracie são artistas que, além de terem demonstrado muita criatividade e originalidade, são bastante conscientes em relação ao significado que suas produções levam para as quebradas do Brasil. Faltou cuidado na construção das faixas, inclusive na hora de amarrar o conceito e entregar para os ouvintes a mesma qualidade de seus projetos anteriores.

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