Leall é daqueles artistas que, desde a primeira vez que você ouve, percebe-se que ele possui uma capacidade de escrita muito polida, não apenas na arte de criar rimas, mas em tratar as temáticas do contexto das periferias e da realidade do que é ser um jovem negro no nosso país com muita riqueza de detalhes e com um cuidado que poucos artistas têm. O ouvinte dificilmente se perderá, porque cada rima, cada verso é bem construído e visceral. Em Você Precisa de um Álibi não é diferente.

Se esse é um prelúdio para o próximo disco de Leall, pode ter certeza de que teremos mais um álbum para ser colocado em pé de igualdade com Esculpido a Machado e Eu Ainda Tenho Coração.
Uma habilidade que o carioca vem melhorando a cada música e projeto, é a forma como entrega essas rimas nas produções. Sua levada, com forte influência do grime, não é atropelada, ele flutua entre momentos mais rápidos e mais lentos com leveza e sem perder a dicção, o que contribui muito para encaixar as palavras com as batidas.
“Eu vou ser luz por onde que eu passar
Enquanto esse meu brilho não se apaga
Se um dia eu tiver medo de voar
Eu juro que abdico dessas asas”
– Leall em “Era Digital”
E, falando de produção, Ávila, Mahai, CHF e El Lif trazem uma variedade interessante, mesmo para um projeto mais curto. Há momentos mais acelerados, seguindo o ritmo do grime, e mais melancólicos, com maior influência do boombap e do jazz. Essas idas e vindas nos estilos favorecem que o projeto mantenha o ouvinte atento.
Em “Noites Traiçoeiras”, por exemplo, há uma sensação de que algo iminente está para acontecer, o que combina com a entrega mais agressiva e confiante de ambos os artistas da faixa, Leall e MC Luanna. E o que dizer de Luanna, que simplesmente não desperdiça nenhuma linha e complementa perfeitamente a ideia da faixa iniciada por Leall: a correria interminável das ruas.
“Se sabe que eu tenho um ponto e você tem sorte de me ver hoje
Aham, quando eu quero ser suporte, quero sentimento e não jogo flores
Uma neguinha desenrolada na selva, concreto ou madeira, faço o movimento
A autoestima sempre quer bater na sexta, me empolgo com ela, igual gilete na parede”
— MC Luanna em “Noites Traiçoeiras”
Ou ainda em “Mulher Brasileira”, a faixa mais acelerada do EP, um grime típico, inclusive com a participação do britânico Blanco. Ambos os artistas descrevem o flerte com a mulher brasileira , criando uma história mais descontraída.
“Sem disse e me disse, no deslize da sua pele preta
Tem o crime, a melanina, passa um filme, essa menina na minha treta
Sobe o BPM, desce o uísque, quer ficar na minha cabeça
Mema vibe, memo pique, eu tô no pique, eu tô de luva, então receba”
— Leall em “Mulher Brasileira”
O único pesar sobre o EP é que o projeto é curto, com apenas seis faixas, deixando aquele gostinho de “quero mais”. Diferentemente de seus discos, não há um fio condutor, mas isso não é, necessariamente, ruim. Se esse é um prelúdio para o próximo disco de Leall, pode ter certeza de que teremos mais um álbum para ser colocado em pé de igualdade com Esculpido a Machado e Eu Ainda Tenho Coração.
