Le Roi est mort, vive le Roi

XTRANHO: Como tentar vender o tédio estético como algo revolucionário

Eu lembro quando o Yeezus saiu e foi a primeira vez que eu ouvi falar do Travis Scott, porque ele produziu no disco. Pouco tempo depois saiu o Days Before Rodeo e o Travis fez uma track com Yung Lean no Unknown Memory, no mesmo ano que saiu Halftime do Young Thug. Vocês lembram como era divertido? Apareceram um tanto de Lils e Yungs e todas as tias ficaram chocadas com as tatuagens na cara. Todas as artistas pop tentaram fazer um trap e o trap deu o tom da era. No mundo todo. 

Já que a gente já pegou a estética do trap toda emprestada deles, talvez a gente possa pegar a morte do trap emprestada também. 

Alguns anos depois aqui no Brasil a gente já tinha funk-trap, trap-sertanejo e até trap acústico. Os trappers eram os maiores nomes da música brasileira, pelo menos em números. Mas, e agora? Tem alguma coisa diferente no ar. 

O centro gravitacional ao redor disso ficou grande demais. O mercado global foi praticamente obrigado a colocar uma lupa no que é que a gente tava tão compulsivamente comprando e vendendo embaixo dessa embalagem do trap. Descobrimos uma série de feridas muito, sinceramente, estranhas: Kanye West virou nazista e a última música do Young Thug ele repete “nigger” 15 vezes no refrão. 80% dos trappers que apareceram, sumiram. Um tanto literalmente morreu. É esse o legado do trap nos EUA. Pessoas mortas, e só quem lucrou foram as gravadoras e a Louis Vuitton. Ariana Grande voltou a ser branca e eu sinto que a gente não tá se divertindo mais. Quando o Kendrick disse “This what the culture feeling” era a respeito de mais do que só o Drake. Já que a gente já pegou a estética do trap toda emprestada deles, talvez a gente possa pegar a morte do trap emprestada também. 

Capa de XTRANHO de Matuê (Foto: Reprodução)

Matuê lançou um álbum criativamente falido e a crítica do G1 disse que ele estavatava copiando o Travis Scott, o Metro Boomin e o Playboi Carti até hoje e que isso é “bastante comercial”, “fútil e adolescente.”. A Carol Prado falou que não é nada disruptivo. No G1! A ferramenta de manutenção do Status Quo criativo está acusando o Matuê de manter o Status Quo criativo. E pior… é meio verdade. Trágico.

A ironia amarga é que ele parou de copiar o Travis Scott para copiar o Yeat e o OSAMASON, sem perceber que isso dificilmente importa. Hip-Hop nos últimos 10, 12 anos, foi marcado por versos bem melódicos, bastante autotune, falar o nome de muita marca e a gente se divertiu! Agora a gente tá pronto pra seguir em frente. Lançar um disco qualquer-coisa pegando relevância emprestada do cara do machado é só meio… chato. O esforço de fazer uma longa e dramática divulgação do álbum como algo revolucionário ou “estranho” torna a coisa toda um pouco constrangedora.

algo me diz que XTRANHO não vai ultrapassar os números do álbum anterior, porque simplesmente não é um bom produto.

A parte mais estranha do álbum é justamente a grandiosidade atribuída a esse pastiche. É como se o espetáculo elaborado ao redor do lançamento estivesse compensando a apropriação tímida dessas sonoridades. Sem a confiança necessária para realmente abraçar as referências, Matuê soa deslocado. As participações, de artistas mais novos e menos cansados, evidenciam isso mais ainda. Não são ótimas participações, mas geralmente são as melhores partes das músicas. O melhor verso do disco não é do Matuê, mas do paulista LPT Zlatan, que parece ser o único com alguma coisa relevante a dizer no projeto.

Chega a ser difícil discutir o álbum como algo além de um produto. Matuê é um empreendedor, dono de uma gravadora. Pra ele, e talvez por consequência pra parte do público, isso é sobre os números. O disco está lá com seus múltiplos milhões de plays com poucos dias de lançamento. Isso são boas notícias, dum ponto de vista de negócios, mas algo me diz que XTRANHO não vai ultrapassar os números do álbum anterior, porque simplesmente não é um bom produto. Talvez a decaída iminente de númerozinhos na tela proponha uma mudança de abordagem muito necessária, mas provavelmente redundante, da manutenção de produtos futuros.

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